quinta-feira, 7 de maio de 2009

ELA

Hoje eu escrevo para ELA.
Não sei como definí-la,
Não sei se sei onde ELA está.
Poderia ser particulas de pó espalhadas pelo centro da cidade, átomos do seu carbono poderiam estar nos ponteiros no relógio no pulso de alguém. Ou ainda, ELA poderia ser carne, estar neste momento, andando por alguma rua estreita em um pedaço qualquer do mundo.
Mas gosto de pensar que ELA poderia ser hoje, uma sombra. Gosto de pensar nisso porque me lembro da música:
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"Quero ser a sombra da tua mão,
A sombra da sua sombra,
A sombra do teu cão".
(A tradução tosca não importa...)
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O fato é que hoje escrevo para essa entidade, esse espírito, essa sombra, que sempre esteve comigo. Devo dar-lhe um nome? Isso eu já fiz há muito tempo.
Desde o tempo em que fomos Amazonas nas florestas da Grécia Antiga.
Fomos Mãe e Filha, Primas, Amigas, Inimigas Mortais, Amantes, Irmãs Gêmeas.
Uma de nós foi jogada aos leões selvagens no alto Império Romano.
Outra, teve o coração arrancado no Egito Antigo.
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Fomos mumificas, enterradas,cremadas,devoradas.
Fomos escrava e rainha; carcereira e prisioneira;
Fomos deusas,devotas,demonios.
Fomos fantasmas que assombraram a mesma casa.
Fomos condenadas a morte; e tivemos vidas esplêndidas.
Fomos carne e espirito que andavam juntos,
Fomos carne e espírito que andaram separados se assombrando.
Fomos para fogueira na inquisição,
Fomos condenadas a morte tantas vezes...
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Mas também tecemos seda,
Fizemos coroas de flores,
Dançamos nuas a luz da lua.
Contamos nossa foruna,
Dividimos um único pedaço de pão.
Nos ajudamos em fugas;
Pintamos telas e dividimos uma infinidade de cigarros.
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ELA teve a mesma cor de olho em todas as vidas. O mesmo tom de pele. A mesma espessura de fio de cabelo.
Nós fomos mulheres em todas as vidas, sempre orgulhosas disso, e assim sempre será.
E tem milhões de anos que isso acontece.
E todas as milhões de vezes eu tive que deixar ela ir.
E até hoje, não me conformo em ter deixado nem uma única vez.
Ainda escrevo para ela.
(Esse eu escrevi há cinco anos atrás)
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Catrina
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E você realmente tinha que me deixar.
Sinto cheiro de açúcar torrado,
Quando sinto a perda de quem nunca me pertençeu.
Quero sempre me deparar com a nuance suave dessa pele,
Com a textura delicada dessa alma que eu sempre conheci.
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Sinto que essa dor se faz necessária.
Seria-me trágico amá-la em meio a letargia da felicidade.
Seria um desperdicio exasperado do sentido de todos os meus dias, não imortalizá-la,
E fazer de você, a última.
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Eu vou colher frutas vermelhas e rosas brancas,
No dia do seu casamento.
E sorrir com a mesma tranparência do seu vestido cerimonial,
Toda vez que você disser que ama aquela que te espera no altar,
Como você jamais imaginou que seria capaz.
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Vou enfeitar seus cabelos finos com flores frescas,
E derramar lágrimas tão brancas quano seu sorriso,
A cada vez que você se for para toda a eternidade.
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E sei que vou lembrar do tempo que já foi apagado.
Do nosso mundo perdido.
E a sua silhueta se afastando, sumindo pelo caminho repleto de folhas escuras...
Assim eu sei que posso lembrar de quando aprendi a chorar,
Acima do instinto natural,
Acima de quando se nasce e descobre que o choro existe.
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Dentro do meu escuro eu guardo as duas pedras de âmbar,
Que eram seus olhos,
Temperados com mel, canela e hortelã.
Eu beijei suas feridas abertas,
Derramei pranto sobre todo o seu corpo,
E fiquei viva para morrer aos poucos.
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E quando seu corpo foi entregue a terra,
Quando se decompos e se separou,
Todas as deusas do mundo,
Voaram enlouquecidas para o subsolo,
E disputaram os átomos da sua beleza.
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O céu estava como que incrustado de cristais,
Rijos e finos como as suas feições lá em cima,
Eu te olhava de baixo com a manta pesada sobre os meus ombros,
Eu era criança mas eu sabia,
Que aquela brancura não te pertencia,
Era marfim derretido, lapidado, envernizado.
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Te vi imovél, te vi de pedra.
Eu estava no tempo em que você foi pedra.
E eu não sei como, mas sabia,
Que já haviam te arrancado um coração.
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E foi assim que a vida sucumbiu e a floresta murchou.
Foi ainda na época da inocência que tudo se perdeu.
Descobrimos um mundo apagado e escuro,
A luz era desnecessária, era incomum.
E percebemos nossas verdades de formas tão distintas...
E não podemos mais acender a luz pela primeira vez.
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Exatamente o que dói, é saber que nunca mais acenderemos a luz pela primeira vez.
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Eu ainda te darei outros nomes, Catrina.
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5 comentários:

Liv Marie disse...

Ciúmes!

Liv Marie disse...

JK...
Muito lindo esse.
O melhor!

Inevitable disse...

O que é Jk?

Anna disse...

OMG, eu tenho uma Catrina. Chorei, Manu.

Li uma vez que os melhores poemas são os que leem a gente e não o contrário. Você conseguiu. :*

Gueibs ManoMona disse...

Quem é ela?
O nome dela?
Para mim é Manuela!